“Quantos animais você vai produzir este ano?”
Esta pode parecer uma simples pergunta, mas foi a responsável por uma grande revolução na forma de olhar e pensar a gestão da produção de suínos. Após realizar este questionamento a centenas de produtores de todos os tipos, tamanhos e estados do Brasil, notamos que poucos (menos de 1%) eram os que respondiam esta pergunta com segurança e de forma concreta.
Ao mesmo tempo líamos vários estudos e autores renomados que traziam afirmações de que empresas sem visão e sem meta tinham os dias contados. Uma referência é a descrição de meta feita por Vicente Falconi, em uma de suas obras, quando ele diz que “meta é o desconforto que leva ao aprendizado e aos resultados”. Isto provocou uma inquietude dentro do nosso grupo de pesquisa, que passou a buscar os motivos, os impactos e como poderíamos apoiar estes produtores a ter uma visão mais clara de onde podem chegar, assim como as condições de chegar lá.
Para definirmos o que este modelo entende como VISÃO, recorremos à frase de Lewis Carrol que diz “Se você não sabe para onde quer ir, qualquer caminho serve”, pois nela fica explícito o maior prejuízo de uma empresa que não tem bem definido o que deseja do seu futuro, ou seja, ela não tem base nenhuma para construir a sua operação e se tornar virtuosa. Saber onde se deseja chegar é o primeiro passo para qualquer empresa realizar um bom planejamento, e consequentemente, a base de uma operação eficiente e alinhada ao que realmente traz valor para os proprietários da empresa.
Somados a esta inquietação, um segundo estudo sobre a base de produtores do Melhores da Suinocultura, benchmarking anual promovido pela empresa Agriness, passou a fazer a correlação entre dados de desempenho produtivo e características ligadas à cultura de gestão e operação da granja. Este estudo revelou que, além de uma visão clara de futuro, as granjas mais produtivas possuíam características semelhantes entre elas. Além disto, experimentos mostraram que estas características podiam ser mapeadas e replicadas em outras granjas menos eficientes, gerando assim, um salto de produtividade.
Foi neste momento que nasceu o Triângulo de Ouro da Gestão, demonstrado na Figura 1, uma estrutura funcional da gestão que traz nos seus três vértices (INFORMAÇÕES, PESSOAS e OPERAÇÃO) as partes principais da produção animal e um núcleo (PLANEJAMENTO) que faz a coordenação da interação entre estes vértices, mantendo o triângulo equilibrado. Esta estrutura em pleno funcionamento dentro da granja se transforma no que denominamos de cultura de gestão.
Figura 1 – Triângulo de Ouro da Gestão
PLANEJAMENTO
Tendo a visão definida, a primeira dúvida de qualquer gestor é “como irei alcançar essa visão, como alcançarei esta meta?”. Isto é respondido pelo PLANEJAMENTO. Ele é o primeiro passo prático no caminho da extração do máximo potencial produtivo da nossa estrutura (OPERAÇÃO). “O planejamento não diz respeito às decisões futuras, mas às implicações futuras de decisões presentes”, segundo Peter Drucker. Ele é o momento que o gestor e sua equipe fazem escolhas, decidem caminhos que irão ser executados e que possivelmente levarão ao encontro da visão.
Dentro das melhores granjas, as mais eficientes, vimos que o planejamento era feito de forma prática e consciente. Identificamos que a clareza da meta anual da granja era uma fortaleza que se espalhava para cada setor, para cada equipe, para cada semana. A execução do que está planejado era levada a sério. Era pauta de frequentes revisões, feitas com base em informação de qualidade e por gestores que se capacitavam para isto.
Dentro deste cenário nasceu o PENSAMENTO+1, um método de gestão da Agriness que traduz de forma simples a complexidade de um planejamento anual da produção, com entregas semanais bem definidas, com o encadeamento lógico entre setores, com uma visão clara sobre as oscilações que são prejudiciais à própria gestão da produção. Dentro do método, a gestão visual, através do Mapa de Produção, transforma o planejamento em um acordo entre todos da granja. Já as reuniões semanais se consolidam como uma rotina de realinhamento, revisão e sustentação das ações estabelecidas no planejamento anual.
Se observarmos na Figura 1 veremos que o PLANEJAMENTO é o ponto central do triângulo. Ele cumpre a função de harmonizar e equilibrar todos os três vértices. Novamente retornando ao estudo, as granjas mais eficientes mostram, naturalmente, uma capacidade de articular problemas técnicos e operacionais com análises robustas baseadas em fatos, dados e informações, com decisões claras e direcionadas às pessoas que estão capacitadas e comprometidas com a tarefa que lhes foi demandada. Há, nestes contextos, um equilíbrio constante e consciente entre todos estes pilares e com isto, a cada dia, cada semana, existe o aproveitamento máximo da capacidade produtiva instalada na granja.
OPERAÇÃO
Dentro da realidade brasileira, nestas últimas décadas, avançamos de forma espetacular nas questões técnicas. Nutrição, sanidade, genética, manejo, instalações e equipamentos tiveram avanços significativos, tornando o Brasil um dos benchmarks da suinocultura mundial. É esta técnica que o vértice OPERAÇÃO representa dentro do Triângulo de Ouro da Gestão.
A escolha de um bom fornecedor de material genético, as rações que melhor desempenham com este plantel, um plano sanitário preventivo e reativo bem construído, ambiência, bem-estar animal, automatizações, são temas debatidos em todos os congressos, feiras, palestras e reuniões de produtores. São questões que estão disponíveis para todos dentro da cadeia produtiva.
Olhando para os melhores produtores identificamos que dentro do planejamento de curto e longo prazo estas escolhas são conscientes e baseadas em informações de qualidade. Vimos também que o gestor tem clareza que para aproveitar ao máximo sua estrutura e os próprios fornecedores (nutrição, sanidade, genética) precisa dar condições para a sua equipe realizar as tarefas que precisam ser realizadas, no prazo que precisam e nas condições que precisam. Além disto, ficou claro que este gestor analisa constantemente se aquilo que deveria ser feito está sendo cumprido e se não está, por que não está. Afinal, seu foco é não deixar que o vértice OPERAÇÃO gere desequilíbrio e comprometa o planejamento.
Figura 2 – Desequilíbrio provocado por falta de qualidade no vértice OPERAÇÃO do Triângulo de Ouro da Gestão
INFORMAÇÃO
É neste ponto que entra a capacidade do gestor de entender os cenários e utilizar INFORMAÇÕES para tomar decisões corretas para o seu negócio, o é que denominado, no mundo da gestão, de Inteligência de Negócio. Temos uma certeza. Não há empresas de sucesso sem esta camada atuante e bem organizada. E isto não é diferente nas granjas avaliadas no estudo que deu base ao Triângulo de Ouro da Gestão.
Figura 3 – Desequilíbrio provocado por falta de atenção no vértice INFORMAÇÃO do Triângulo de Ouro da Gestão
Sendo assim, este modelo traz um vértice específico para INFORMAÇÕES, já que elas são a base para que um gestor construa conhecimento e inteligência sobre o seu negócio. É aqui que processos de coleta de dados, organização e sistematização de informações, ferramentas (softwares, quadros, relatórios, etc), processos de uso e análise, entre outras ações importantes, são avaliadas.
Temos centenas de exemplos do bom e do mau uso da informação no dia a dia da granja. Vamos utilizar um para transmitir o poder que o bom uso da informação pode causar dentro da busca pelo máximo potencial produtivo de uma produção de suínos.
Neste ponto entendemos que hoje a informação se transformou na principal matéria-prima para o crescimento da suinocultura brasileira, por ter um impacto mais imediato com menor investimento, se comparado às pesquisas científicas nas áreas mais técnicas, como genética, nutrição e sanidade. A comprovação vem das próprias granjas, pequenas ou grandes, que se utilizam deste vértice para ajustar a condução dos processos
PESSOAS
“Na suinocultura, as unidades produtivas foram concebidas para que utilizemos todo o potencial existente, seja de genética, instalações, nutrição ou de sanidade. Precisamos então capacitar as pessoas para que consigam utilizar esses recursos de forma a extrair o máximo potencial que eles oferecem. Isso significa que, se uma genética tem potencial para entregar 32 desmamados por fêmea ao ano, nada mais certo do que aproveitar esse potencial, alcançando o número prometido”. – trecho do livro Suíno.Cultura.
Para isto, uma granja equilibrada possui o vértice PESSOAS estruturado onde papéis, responsabilidades, funções, bem-estar, motivação, engajamento, meritocracia, entre outras questões importantes são trabalhadas de forma alinhada com a visão da empresa. Isto ficou muito nítido ao avaliar as 10 primeiras colocadas do Melhores da Suinocultura destes oito anos, pois em todas as granjas o gestor procurava criar um ambiente de confiança e harmonia entre as pessoas, criando espaços para capacitação técnica, análise das informações, comemorações e distribuições de resultados alcançados na forma de prêmios, por exemplo. Já nas granjas onde isto não funcionava bem, fica nítido que os outros vértices passavam a não funcionar também (veja Figura 4), ou seja, PESSOAS mal geridas, desengajadas, descomprometidas são um dos piores problemas de gestão que uma granja pode ter.
Figura 4 – Desequilíbrio provocado por falta de trabalhar conscientemente o vértice PESSOAS do Triângulo de Ouro da Gestão
Segundo Drucker, “Nenhuma empresa é melhor do que o seu administrador permite”. Esta afirmação foi comprovada na prática através deste trabalho, onde vimos que na suinocultura as boas granjas possuem bons líderes. O Triângulo de Ouro da Gestão não deixa explícito o papel do líder, colocado no vértice PESSOAS, mas conceitualmente sabe-se que ele tem fundamental importância, pois detém a condição de liderar o aproveitamento máximo de cada parte da produção ou então decidir por não dar atenção a elas e, com isto, não ter uma granja de alto desempenho.
Neste sentido, para tornar claro o que é um bom líder dentro desta visão, listamos abaixo as principais características observadas nas granjas de melhor desempenho:
- Auto responsabilidade: “Você está onde você se colocou, assuma isso”, esta é uma máxima dos líderes. Eles não buscam justificativas para os problemas, mas sim soluções.
- Foco: Têm clareza de que precisam focar em determinadas questões que vão realmente criar os resultados que desejam. E este foco tem uma qualidade positiva, ou seja, buscam aprender as lições em cada uma das situações, sejam vitórias, derrotas ou batalhas.
- Atitude de fazer: Sabem a importância da realização do que foi planejado, das constantes análises de melhoria, da necessidade de realizar mudanças. Eles não têm receio de fazer, mas fazem alinhados à visão estabelecida.
- Relaciona-se com pessoas: “87% dos fracassos profissionais são por falta de habilidade em relacionar-se e trabalhar em conjunto” – FORTUNE, por isso os bons líderes buscam criar um ambiente onde conquistem a confiança das pessoas. Eles possuem ferramentas que permitem aproveitar melhor cada colaborador, colocando-os em uma zona de maior desempenho (veja Figura 5). Um líder inspirador consegue desenvolver os potenciais da sua equipe e possui uma comunicação aberta (fala a verdade sem julgar).
- Valores e propósito: Te clareza do por que fazem as coisas e de onde querem chegar. Fazem estas escolhas baseados em valores claros e sólidos, o que os tornam mais consciente dos limites e das possibilidades do seu negócio e da sua própria liderança.
- Rotina de gestão: possuem uma rotina de gestão clara e recorrente. Abaixo listamos alguns pontos macros para exemplificar:
- Final do ano planejam o ano seguinte.
- Fazem uma análise dos indicadores do último ano para terem uma base de decisão.
- Compartilham com a sua equipe esta visão e acordam junto com eles, quais os números que se pretende alcançar.
- Acompanham semanalmente as metas de cada setor com sua equipe.
- Mensalmente avaliam se as entregas realizadas estão alinhadas com a meta do ano, e caso não, avaliam os pontos de correção e criam planos de ação para que sejam executados.
- Semestralmente fazem uma avaliação geral para promoverem ajustes maiores.
CONCLUSÕES
Como colocado, os estudos realizados tinham por objetivo identificar claramente a diferença entre os mais e os menos produtivos dentro da suinocultura. A partir disto, identificar o que havia em comum entre os que possuíam resultados exemplares e o que era comum entre aqueles que estavam operando abaixo do seu potencial disponível. O resultado desta busca foi a clareza do que realmente faz a diferença na produtividade de uma granja e, posteriormente, a materialização destes pontos comuns em um modelo de gestão que pode ser replicado em outras granjas, o qual demos o nome de “triângulo de ouro da gestão”.
Ficou claro que “o planejamento não é uma tentativa de predizer o que vai acontecer. O planejamento é um instrumento para raciocinar agora, sobre que trabalhos e ações serão necessários hoje para merecermos um futuro”, como citado por Peter Drucker. E que nas granjas de alto desempenho existem bons líderes que conseguem harmonizar os três vértices do triângulo através de um planejamento bem feito e bem executado. Estes líderes criam o que chamamos de cultura de gestão dentro das suas organizações, sustentando assim, boas práticas, utilizando muito bem informações e ferramentas e, o mais importante, dando espaço e condições para que as pessoas possam desempenhar suas verdadeiras funções.
Além disto, e talvez o ponto mais importante do trabalho, ficou confirmado que para uma granja se tornar altamente produtiva, a base do triângulo precisa estar organizada. INFORMAÇÕES e PESSOAS são fundamentais para que a OPERAÇÃO aconteça. É visível que nas granjas onde o foco é exclusivamente técnico os desempenhos são menores e o esforço de uma manutenção de produtividade quase desumano.
Neste sentido, o convite é manter o triângulo sempre equilátero, ou seja, ter informações de qualidade e disponíveis, pessoas engajadas, capacitadas e alinhadas com o planejamento, questões técnicas resolvidas e constantemente monitoradas. A harmonização destes pontos e a construção de uma cultura de gestão sólida é a grande diferença entre os melhores e os piores.
Autores:
Eduardo Hoff – Agriness
Everton Gubert – Agriness